A HISTERIA DE ANGÚSTIA NA INFÂNCIA
Autor: Mônica Perny
Introdução
Este ensaio busca
fazer um recorte referente a fobia infantil e a formação do sintoma fóbico,
tendo como objetivo compreender a relação da fobia articulado com a curiosidade
infantil. O referencial teórico tem como
base obra freudiana “Análise de uma fobia em um menino de cinco anos”,
publicada em 1909, conhecida como o caso do “Pequeno Hans”. Sigmund Freud
acreditava na possibilidade de "se observar em crianças, em primeira mão e
em todo o frescor da vida, os impulsos e desejos sexuais que tão laboriosamente
desenterramos nos adultos dentre seus próprios escombros" (FREUD, 1909,
p.16).
O primeiro caso da psicanálise freudiana com criança
"O pequeno Hans", é considerado o primeiro caso da
psicanálise freudiana com criança.
Apesar Freud não ter tratado o menino diretamente, ele registra a
importância de sua observação:
Quando um médico trata de um neurótico adulto pela
psicanálise, o processo que ele realiza de pôr a descoberto as formações
psíquicas, camada por camada, capacita-o, afinal, a construir determinadas
hipóteses quanto à sexualidade infantil do paciente; e é nos componentes dessa
última que ele acredita haver descoberto as forças motivadoras de todos os sintomas
neuróticos da vida posterior (FREUD, 1909, p.15).
Portanto é correto afirmar que, as fobias podem surgir na
infância e se não tratadas adequadamente, poderão persistir e tornar-se
problemática na idade adulta. Freud já havia formulado estas hipóteses numa
obra anterior – Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade (1905 d).
Ao publicar seus estudos sobre a sexualidade infantil, Freud
ousou e escandalizou a sociedade vitoriana, ao discorrer teoricamente sobre
aspectos inconscientes presentes na infância nunca antes pensados, tais como:
excitação sexual, estimulação genital infantil e tendo como consequência o
surgimento das angústias, medos e conflitos no sujeito.
A análise do pequeno
Hans
O pequeno Hans se chamava Herbert Graf. Nasceu em 1903 e morreu
1973. Hans foi a primeira criança a ser atendida através do método
psicanalítico freudiano, tornando-se como paradigma para o desenvolvimento da
psicanálise com crianças, especialmente desenvolvidas por Anna Freud e Melanie
Klein. A análise do pequeno Hans iniciou quando o menino tinha três anos de
idade, porém, os primeiros relatórios enviados pelo pai do menino, Max Graf, a
Freud sobre o desenvolvimento do filho datam de um período pouco anterior. Portanto Freud foi o analista propriamente
dito do o menino, mas participou como supervisor do caso. Max Graf mostrou
interesse em anotar suas observações sobre a vida sexual do filho a partir do
seu entusiasmo pelos relatos de sua esposa, Olga König, que havia realizado
análise com Freud, e também por ter sido incentivado em registrar estas
observações durante sua participação assídua nas Reuniões da Sociedade
Psicológica das Quartas-Feiras. Para Freud estes registros tornavam-se
fundamentais para comprovar suas teorias sobre a sexualidade infantil que até
então obtidas a partir do tratamento em adultos Após a análise dos relatórios
enviados pelo pai de Hans, Freud selecionava apenas os que abordavam as
questões relativas à curiosidade sexual do filho. Freud centrou a análise do
menino em torno do complexo de Édipo e de castração, tendo como objetivo
desenvolver sua teoria sobre a angústia de castração. Segundo Freud, “Hans era
realmente um pequeno Édipo que queria ter seu pai “fora do caminho”, queria
livrar-se dele, para que pudesse ficar sozinho com sua linda mãe e dormir com
ela” (FREUD, 1909, p. 103).
Quando tinha três anos, Hans começou a demonstrar um
interesse obsessivo por seu pênis, chamado por ele de "faz-pipi” e pelo
órgão sexual da mãe, que ele também chamava de "faz- pipi”, portanto o
menino apresentava um interesse libidinal ligado à masturbação e curiosidade
sexual. Posteriormente ele passou a ter interesse também pelo "faz-pipi”
de outros seres animados. Sua mãe por diversas vezes lhe ameaçara cortar o
“faz-pipi” caso o tocasse e segundo Freud estes eventos permitiram o menino a
vivenciar o Complexo de Castração.
Quando Hans tinha três anos e meio, questionava sobre o nascimento de sua irmã,
Hanna. Segundo Barros (1988) as práticas masturbatórias e o nascimento da irmã
leva ao rompimento na relação dual entre Hans e sua mãe.
A histeria de
angústia infantil
Os primeiros indícios de fobia são relatados pelo pai de
Hans, quando o menino passa a não querer sair de casa por sentir medo de
cavalos e temer ser mordido por eles. A primeira manifestação da fobia de Hans
aconteceu num ele passeio com a babá quando começou a chorar, pedindo para
retornar para casa. Segundo a observação de Freud este episódio não apresentou
subsídios clínicos para que Hans fosse diagnosticado com agorafobia. O termo
fobia é derivado do grego phobos. Na
psicanálise a fobia não é considerada uma neurose, mas sim um sintoma Segundo
Freud Hans apresentava um distúrbio psiconeurótico dos mais comuns - a histeria
de angustia. Uma de suas características é poder surgir na fase infantil e por
isto considerada como uma neurose da infância por excelência. Na opinião de Freud, de todos os distúrbios
psiconeuróticos, a histeria de angústia, é a que “menos dependente de uma
disposição constitucional especial e é consequentemente, o mais facilmente
adquirido em qualquer época da vida” (FREUD, 1909, p. 107).
A histeria de angústia é uma neurose do tipo histérico, na
qual o sujeito converte uma angústia num terror sem motivo, diante de um
objeto, um ser vivo ou uma situação que não apresentam em si nenhum perigo
real. Na psicanálise freudiana, a sexualidade situa-se no centro do sintoma
fóbico da histeria de angústia. A fobia
é um sintoma muito comum na infância, especialmente quando a criança vivencia
um sentimento antagônico para uma única pessoa. No caso de Hans para o pai: ele
ama o pai que o protege, mas também o odeia por este lhe impor limitações aos
seus irrefreáveis desejos. Diante deste conflito de sentimentos o menino tentou
eliminar um destes sentimentos "ambivalentes", optando pelos mais
hostis conferindo um destino específico para estes: o deslocamento. Na análise
de Freud, Hans apresentava fobia por cavalos. Freud associou os cavalos ao pai
de Hans, conforme texto abaixo:
[...] revelei-lhe então que ele tinha medo de seu pai
exatamente porque gostava muito de sua mãe. Disse-lhe da possibilidade de ele
achar que seu pai estava aborrecido com ele por esse motivo; contudo isso não
era verdade, seu pai gostava dele apesar de tudo, e ele podia falar abertamente
com ele, sobre qualquer coisa, sem sentir medo. Continuei, dizendo que bem
antes de ele nascer eu já sabia que ia chegar um pequeno Hans que iria gostar
tanto de sua mãe que, por causa disso, não deixaria de sentir medo de seu pai;
e também contei isso a seu pai (Freud, 1909, p. 45).
Considerações finais
Hans não teve sucesso
na eliminação de seus sentimentos hostis pelo pai, o que resultou numa fobia,
que nada mais é do que o deslocamento estratégico dos sentimentos de uma
situação original para uma outra remota: o medo na situação original (o medo do
pai) desloca-se para outro “objeto” do qual Hans é capaz de se defender ficando
fisicamente distante: o objeto fóbico (cavalo). Isto explica o fato do menino
apresentar um medo desproporcional e injustificado por cavalos.
Hans desenvolveu algumas fantasias fóbicas como mecanismo de
defesa para atenuar sua angústia de castração, ou seja, a fantasia ocupa o
lugar do falo perdido. O menino ao se deparar com a privação materna elege um
elemento imaginário ligado a sua fobia.
Na análise de Freud a fobia de cavalos de Hans estava relacionada ao
medo inconsciente de ser castrado pelo pai devido do amor que nutria pela mãe.
A manifestação do complexo de Édipo promoveu a cura do pequeno infante e foi de
inestimável valia para Freud teorizar essa sua experiência prática. Portanto
qualquer fobia é manifestação de uma angústia profunda, muitas vezes sem
relação aparente com o objeto fóbico.
Referências
BARROS, Romildo R. do Rêgo. Alguns comentários sobre a
solução fóbica, in: A ordem do sexual. Rio de Janeiro: Campus, 1988, p.
33.
FREUD, S. (1909) Análise de uma fobia em um menino de cinco
anos. Vol. X. In: Edição Standard das Obras Psicológicas Completas de Sigmund
Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996.
ROUDINESCO, E.; PLON, M. Dicionário de psicanálise. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
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